FLEXIBILIZAÇÃO DA EXECUÇÃO DA PENAS E DAS MEDIDAS DE GRAÇA

Lei n.º 9/2020 de 10 de abril vem dispor sobre o regime excecional de flexibilização da execução das penas e das medidas de graça, no âmbito da pandemia da doença COVID-19. Trata-se da lei que vem permitir um perdão parcial de penas de prisão de duração igual ou inferior a dois anos, um regime especial de indulto das penas, um regime extraordinário de licença de saída administrativa de reclusos condenados e a antecipação extraordinária da colocação em liberdade condicional.
A supra mencionada lei entrou em vigor no passado dia 11 de abril, um dia após a sua publicação no Diário da República.
De salientar que as medidas apresentadas pela Lei n.º 9/2020 não são aplicáveis a condenados por crimes cometidos contra membro das forças policiais e de segurança, das forças armadas e funcionários e guardas dos serviços prisionais, no exercício das respetivas funções.

Relativamente à medida excecional de perdão parcial de penas, o artigo 2º, estabelece, nomeadamente, que:

    1. São perdoadas as penas de prisão de reclusos condenados por decisão transitada em julgado, de duração igual ou inferior a dois anos;
    2. São também perdoados os períodos remanescentes das penas de prisão de reclusos condenados por decisão transitada em julgado, de duração superior à referida no número anterior, se o tempo que faltar para o seu cumprimento integral for igual ou inferior a 2 anos, e o recluso tiver cumprido, pelo menos, metade da pena;
    3. Nas situações supra referidas o perdão só pode ser aplicado uma vez por cada condenado;
    4. É abrangida por este regime a prisão subsidiária resultante da conversão da pena de multa em pena de prisão por não cumprimento da pena de multa de substituição e, em caso de cúmulo jurídico, incide sobre a pena única.
    5. Não são beneficiários do perdão parcial de penas, os condenados por:
      a) Crimes de homicídio;
      b) Crime de violência doméstica e de maus tratos;
      c) Crimes contra a liberdade pessoal;
      d) Crimes contra a liberdade sexual e autodeterminação sexual;
      e) Crimes de roubo previstos na alínea a) do n.º 2 e no n.º 3 do artigo 210.º do Código Penal, ou previstos nessa alínea e nesse número em conjugação com o artigo 211.º do mesmo Código;
      f) Crimes contra a identidade cultural e integridade pessoal;
      g) Crimes de perigo comum, especificamente, incêndios, explosões e outras condutas especialmente perigosas, libertação de energia nuclear e incêndio florestal quando cometidos com dolo;
      h) Associação criminosa;
      i) Branqueamento;
      j) Recebimento indevido de vantagem, corrupção passiva e corrupção ativa;
      k) Tráfico;
      l) Crime enquanto membro das forças policiais e de segurança, das forças armadas ou funcionários e guardas dos serviços prisionais, no exercício das suas funções, envolvendo violação de direitos, liberdades e garantias pessoais dos cidadãos, independentemente da pena;
      m. Crime enquanto titular de cargo político ou de alto cargo público, magistrado judicial ou do Ministério Público, no exercício de funções ou por causa delas;
      n. Ofensa à integridade física grave (artigo 144º Código Penal)  e ofensa à integridade física qualificada (artigo 145.º, nº. 1, alínea c do Código Penal), inclui-se ainda o disposto no artigo 147º. do Código Penal;

6. Esta medida é concedida a reclusos cujas condenações tenham transitado em julgado em data anterior à da entrada em vigor (11.04.2020) da presente lei e sob a condição resolutiva de o beneficiário não praticar infração dolosa no ano subsequente, caso em que à pena aplicada à infração superveniente acresce a pena perdoada.

Quanto ao indulto excecional, o artigo 3º prevê, nomeadamente que: 

    1. O membro do Governo responsável pela área da justiça pode propor ao Presidente da República o indulto, total ou parcial, da pena de prisão aplicada a recluso que tenha 65 ou mais anos de idade à data da entrada em vigor (11.04.2020) da presente lei e seja portador de doença, física ou psíquica, ou de um grau de autonomia incompatível com a normal permanência em meio prisional, no contexto desta pandemia;
    2. O diretor do estabelecimento prisional a que está afeto o recluso condenado, obtido o consentimento deste, remete, em 48 horas, ao diretor-geral de Reinserção e Serviços Prisionais, proposta de indulto excecional acompanhada dos seguintes elementos:
    3. Informação médica sobre o estado de saúde, física ou psíquica, do recluso e o seu grau de autonomia e a sua incompatibilidade com a normal manutenção em meio prisional;
      b) Informações constantes do processo individual do recluso;
      c) Registo criminal atualizado do condenado;
      d) Cômputo da pena, homologado pela autoridade judiciária competente.
    4. Tal como no perdão parcial das penas, não podem beneficiar do indulto excecional, os reclusos condenados pela prática dos crimes referidos supra nas várias alíneas do nosso número 5 (quanto ao perdão);
    5. Os pedidos de indulto podem ser apresentados pelos interessados no prazo de 3 dias úteis contados da entrada em vigor da presente lei (até 15.04.2020), devendo ser subsequentemente instruídos em 5 dias úteis.

Por fim, o artigo 4º consagra, quanto à licença de saída administrativa extraordinária, nomeadamente, que:

    1. Pode ser concedido ao recluso condenado, mediante o seu consentimento, licença de saída pelo período de 45 dias, desde que cumulativamente se verifiquem os seguintes requisitos:
      a) O preenchimento dos pressupostos e critérios gerais de concessão da licença de saída previstos no artigo 78.º do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade;
      b) O gozo prévio de pelo menos uma licença de saída jurisdicional ao recluso que cumpre pena em regime aberto ou o gozo prévio de duas saídas jurisdicionais ao recluso que cumpre pena em regime comum;
      c) A inexistência de qualquer situação de evasão, ausência ilegítima ou revogação da liberdade condicional nos 12 meses antecedentes.
    2. Recaem sobre o condenado os deveres de permanecer na habitação e de aceitar a vigilância dos serviços de reinserção social e dos elementos dos órgãos de polícia criminal territorialmente competentes, cumprindo as suas orientações e respondendo aos contactos periódicos que com ele vierem a estabelecer, nomeadamente por via telefónica;
    3. A licença de saída pode ser renovada, mais do que uma vez e por períodos de até 45 dias, em função da conduta assumida pelo recluso e do contexto sanitário decorrente da doença COVID -19;
    4. Durante a vigência da licença de saída, o recluso que cumpre pena em regime aberto pode ser autorizado a manter a atividade laboral que desenvolvia fora do estabelecimento prisional;
    5. Para efeito de adaptação à liberdade condicional, verificado o gozo, com êxito, de licença de saída administrativa concedida, a colocação em liberdade condicional pode ser antecipada pelo tribunal de execução das penas, por um período máximo de seis meses.